quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

AVE FERIDA NÃO VOA


Cansada de sofrer, Amália jogou fora a flor que Santiago lhe enviara junto de um belo convite para um encontro próximo à ponte azul na estrada que passava pelo Rancho da Garça Vermelha. 
Esta última brincadeira do maior amor de sua vida foi o fim de todas as sensações, de todas as emoções, porque ele não compareceu.
E Amália, ao jogar a flor, prometia esquecer, dar um basta, não ouvir mais o coitado do coração. 
Aquele amor fez com que envelhecesse dez anos.
Por que Santiago continuava a brincar com ela?
Da ponte até a sua casa era bem pertinho. E Amália decidiu ir embora.
- Oi, filha! - era a mãe, acolhendo-a, com um longo abraço - Onde estava a minha menina?
- Fui até à ponte, mãe. O Santiago disse que me encontraria lá, mas de novo, mãe, ele não apareceu...
Mais um longo abraço da mãe que tentava acalmar a menina cada vez que esses acessos tomavam conta do seu ser.
- Filha, filha, você tem que esquecer. Santiago foi embora, não vai vir nunca mais. 
Foi de repente que Amália viu uma luz muito forte, muito nítida e deu um grito:
- Olha, mãe, o Santiago vem vindo ali...Ah, mãe, ele não me esqueceu. Ele nunca poderia ter-me esquecido. 
E correu para o espaço vazio, braços abertos, rodopiando feito uma gaivota, livre, gritando o nome dele.
Mas do mesmo jeito que ela se jogou no tempo, eis que de repente tudo foi ficando quieto, estranho, mórbido. 
Quase que o coração da mãe parou ao alcançar a filha e encontrá-la abraçada a um pedaço de tronco de árvore.
- Até quando, meu Deus? Até quando? - murmurava.
Amália realmente não fazia mais parte deste mundo e, para ajudá-la, a mãe teria que colocá-la sob os cuidados de alguns especialistas da alma. 
Antes que o amor do saudoso Santiago levasse embora de uma vez a sua filha. 
- Filha, venha, vamos para casa, querida!
     

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

O QUE É ? O QUE É?


O QUE SERÁ QUE É ISTO
ENROLADO FEITO BOLA 
NUMA ANTENA DE TV?

NUMA OUTRA ENCARNAÇÃO,
SE ACASO DEUS PERMITIR,
QUERO VOLTAR PASSARINHO:
PODE SER UM BEM-TE-VI!

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

"A BENÇÃO DA CHUVA"


Uma chuva abençoada 
vai caindo no sertão...

Foi Deus quem mandou; por sorte,
haverá feijão e milho, 
muita soja, trigo, cana
e água boa pra beber...

Senhor, que neste sertão
de gente humilde e sincera
nunca deixe de existir
a esperança serena
em Teu amor dadivoso.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

" PÉ DE IPÊ "








É tão linda esta cor dourada que cobre o pé de ipê
que minha alma rejuvenesce a cada manhã
quando abro as janelas de casa
para um novo dia que já nasceu.
E ao vê-lo tão majestoso e altaneiro,
nesse convite festivo às aves ciganas
que aportam em seus galhos 
para saborear seu mel,
me chega de repente,
sucintamente,
meiga e vagarosamente,
a imagem daquela que lhe possibilitou 
agigantar-se de uma simples brota, 
a minha mãe!
Com mãos pequeninas e olhar contemplativo,
ela amparou, dia e noite, feito mãe e filha.
E não plantou para gáudio próprio, 
e, sim, para cumprir seu papel de cidadã.
Tenha certeza, minha mãe,
que toda vez que esse pé de ipê abrir-se em flores,
elas serão em homenagem a você.
Obrigada, mãe!


- Luiza Válio -

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

"ÁGUA SANTA"



Água que jorra da terra
como criança do seio materno
e serve de alimento a todos os seres vivos,
conhecidos e desconhecidos,
traz bençãos de Deus escondidas
nos reflexos das ondas embriagadas 
pelos tantos cheiros da mata.
Parece que a luz da eterna revivência
em seu âmago vem fazer brotar 
mais vidas que se alinham
num constante balouçar.
Água que jorra da terra
é mais do que ouro e prata,
é essência que preenche 
o vácuo sombrio da silente natureza.

Luiza Válio. 

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

"CAMINHO SEM VONTADE DE PARTIR"



"Caminho assim, quem dera poder trafegar
num dia sereno, 
longe da angústia diária,
na alma levando somente o presente
sem sombras passadas, sem vidas perdidas
que o espelho quebrou.
Que maravilha sentir a brisa no rosto,
os cabelos voando como nas sereias do mar...
Ser de novo criança 
e correr pela estrada
soltando todas as risadas
que puder rememorar...
E dar cambalhotas,
sentar na terra,
deitar na areia,
auscultar o chão como fazem os índios...
Ah! 
desenhar um céu com estrelinhas, 
a lua, umas casas, 
uma lagoa e os patinhos,
uma ponte e um pescador voltando pra cabana,
uma igrejinha...
Caminho assim, quem dera saber onde encontrar!"

Luiza Válio.

terça-feira, 8 de julho de 2014

"PEQUENA SEREIA"




QUE LINDA BORBOLETA
QUE PASSA SOZINHA
E NAS ÁGUAS DO REGATO
PÕE-SE A DANÇAR!

BRILHANTE E SENSÍVEL
PARECE UMA DEUSA
NEM A FORÇA DO VENTO
A CONSEGUE LEVAR.


ESSE CACHORRO FALA



- Para contar a história, só ficou o cachorro.
- Mas cachorro não sabe falar!
- Sabe, sim. Esse cachorro fala.
- Como?
- Quem o vê, sabe que era amigo e único irmão do homem que morava no fim da rua da Seresta, no alto da cidade. Sabe também que eles não se largavam por nada e nem por ninguém. Quantas vezes ambos passavam silenciosamente, maltrapilhos e maltratados, pedindo um pedaço de pão na padaria do Mestre Pupolino. Quantas outras vezes, lado a lado, passavam tristes a caminho do cemitério local visitar os túmulos das três meninas e da mãe, todas elas mortas por afogamento no grande rio que circundava a pequena cidade. Esse cachorro fala, sim.
- Que houve com as meninas e a mulher dele?
- Foi numa manhã de sexta-feira; de repente, uma tempestade, uma enchente. Elas estavam passeando de barco. Não houve tempo de nada.
- Judiação!
- Foi mesmo. Agora, a judiação é ver o cachorro uivando a falta do homem. 
- Onde está o homem?
- No último sábado, ele foi à missa, confessou-se com o padre, estava até bem disposto; parecia feliz, depois de tanto tempo sem transparecer nada além de desânimo. 
- ?
- Pois lá ficou o cachorro esperando por ele na margem do rio. Desapareceu. O cachorro fica lá, uivando de dor. Você ainda acha que esse cachorro não fala?
- Esse cachorro fala!   

sexta-feira, 6 de junho de 2014

"O MENINO QUE VIRIATA LEVOU"













Chamava-se Dutra.
Dutra não é nome; é sobrenome, mas as pessoas acabaram acostumando-se com ele.
Era um menino triste, corcunda, de pele amarelada, orelha direita faltando um pedaço. 
Tinha vergonha de procurar companhia, de ir à escola, de falar com as pessoas. Aliás, por não ter com quem conversar, atrofiaram-se-lhe as cordas vocais.
Órfão, fora criado pela "tia" Viriata, uma prima distante do suposto pai, que o maltratava muito e fora a responsável por aquela corcunda que lhe nasceu às costas.
Um belo dia, a "tia" acabou indo morar nas alturas - decerto estaria confinada a um purgatório sem fim - e o menino trancou-se na choupana da velha.
Foi então que ele descobriu guardados numa caixa uns papéis estranhos, umas fotografias, uns envelopes que nem haviam sido abertos e imaginou que seriam histórias da própria família, ele que achava que nem tinha uma...
Lembrou que não sabia reconhecer letra alguma, mas de repente seu rosto se alegrou: o padre Sodevalino poderia explicar aquelas coisas para ele.
E então, no dia seguinte, bem cedinho, ele foi atrás do bom padre que o atendeu com solicitude e carinho:
- Mas Dutra, onde é que você estava escondido? Por que se afastou da igreja? Você que gostava tanto dos cultos!
Gostoso mesmo foi o abraço com que o padre lhe presenteou.
- Que bom sentir esse aconchego! - pensou
Olhando para a caixa, o padre falou:
-  Dutra, aqui estão coisas que devem pertencer ao passado de sua família. Lembro que a sua tia Viriata me disse uma vez que havia uma caixa dessas em sua casa. Eu fiquei de ver isso, mas acabei me esquecendo e a Viriata nunca mais me visitou.
E, mostrando-lhe uma foto:
- Veja que linda esta menina! Parecem mãe e filha.
De repente, o padre Sodevalino parou de falar e pôs-se a ler. 
Eram cartas e mais cartas, pedaços de uma vida que o padre foi revelando ao velho menino, soltando, de vez em quando, a mesma expressão.
- Judiação!
- Mas que judiação!
- Dutra, amanhã bem cedo nós vamos viajar. Tem um endereço aqui e eu acho que o mistério de sua vida vai estar explicado. Porque de fato não acreditava muito na história que a Viriata contava. 
- Sabe o que está-me parecendo? Que Viriata nem era sua parente, nem parente do seu pai como ela afirmava...
E de manhã, partiram o menino e o padre. 
Nunca que aquele menino foi tão feliz como naquele instante em que retrocedia no tempo em busca de si mesmo.
Quando o trem parou, o coração do menino também parou. Pressentimento? 
O endereço era pertinho da estação. 
Uma casa velha, enorme, austera, toda pintada de marrom, com janelas azuis, um jardim que escondia flores de diferentes matizes e cheiros.
- Que maravilha de lugar! - exclamou o padre.
Alguém surgiu na trilha que dava para o interior da casa. 
Ao ver o menino, a aparição soltou uma expressão de horror:
- Nossa Senhora! O patrão voltou...
E o patrão era o Dutra.
Patrão, porque era a cara do pai falecido há seis meses num acidente de carro.
Dutra que havia sido sequestrado desde bebezinho por uma antiga empregada invejosa da felicidade que habitava no lar daquela família. 
Dutra que, na realidade se chamava Dogmar Barelli.
Dutra que tinha mãe e ela vinha ao seu encontro, cambaleando, triste, sem entender o que Deus lhe reservava.
Olhou para o menino, apertou-se a ele, pediu-lhe perdão e o beijou.
Depois de tanto tempo mudo, o velho menino Dogmar gritou:
- MÃE? MINHA MÃE? 
E foram todos para dentro de casa a fim de recuperar a vida que durante tanto tempo ensurdecera por ali.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

"CRIANÇA"




Criança, não esqueça
que a natureza depende de nós,
que a nossa vida depende de nós,
que precisamos plantar sementes boas
para que a felicidade não se canse de nós,
para que o futuro venha risonho
e as pessoas possam melhorar a cada dia.

Criança, não deixe
que o coração comece a cultivar 
o negro do ódio, 
o horror das vinganças,
o amargo da guerra
que só trazem miséria e solidão.
Antes, caminhe em busca do bem
e encontrará a harmonia,
o destemor,
o veio da vida,
a fonte do amor.

Criança, aprenda bem cedo
que o amor supremo tem apenas um nome: 
- É Deus!

"SENSÍVEL CORAÇÃO"




Não há nada mais sensível no mundo
do que este meu coração
que gosta de alguém 
que nem nome tem
que os olhos não veem
que nem pode caber
numa sombra sequer
da palma da mão.

Não há nada mais sensível e teimoso
do que este pulsar
furtivo e choroso 
que busca e rebusca
suspiros e afagos 
e aconchego também
e, finalmente,
num susto prender-se
à magia de um amor
libertado e feliz. 

Luiza Valio

domingo, 25 de maio de 2014

"BEM TE VI, Ó PASSARINHO"



Esses 
alados animaizinhos
são tão ariscos...
Parecem 
pensamentos soltos,
ou memórias desgarradas
na cabeça dos tolos,
que,
coitados!
num mundo de hoje
não encontram mais lugar
a não ser no coração
daqueles que experimentaram 
os momentos, as pessoas, as coisas, os amores, as vidas,
e tudo o mais,
para depois perder!

terça-feira, 13 de maio de 2014

"SONHO BESTA"


Um lugar qualquer,

uma casa ou casebre,
um mamoeiro,
umas flores,
plantas rasteiras,
tudo dentro
de um quintal de terras
cercado por muros
que o homem chama de seu.
Que sonho mais besta 
para quem desta terra nada vai levar!...


Luiza Valio

quarta-feira, 2 de abril de 2014

"SOMBRAS"


O que pensarão 
nossos amigos - as avezinhas -
quando o dia vai embora
e a noite cai por sobre os seus ninhos?
 ...
Terão todos eles
os nossos amigos - as avezinhas -
um ninho bem morninho
para esperar que, 
após o desmaio da noite,
chegue, enfim, um novo dia?
...

"E QUANDO O DIA AMANHECE..".


Quando o dia amanhece,
surgem nos céus 
as aves de bom agouro.
São lindas,
pequenas,
travessas, 
barulhentas.
Mas não são lentas
e vão deslizando qual leque aberto
num extenso musical.


"OBSERVANDO A VIDA"


As aves
Deus as criou 
para serem vigilantes,
para sondarem noite e dia, 
mudas e frias,
 desde os recônditos mares
às mais tenebrosas cavernas
e às mais inóspitas montanhas.
Das aves
o canto,
com certeza, sinaliza
que a vida morre amanhã
nalgum lugar
para que o hoje continue sempre verde
aqui e agora.


sexta-feira, 28 de março de 2014

"MEDO GRANDÃO"




Tenho medo das noites
no sertão,
das matas que escondem
sombras, 
peçonhas, 
negra luz.
Infeliz quem reside
nesses fins de mundo
e tem que ir pra cama
tão logo as galinhas 
se aquietem nos ninhos
e os pássaros adormecem
num galho qualquer 
sobre uma bica d`água.
Tristes, tão tristes me soam
os ecos dos ventos
carregados de uivos e de vozes do além...

domingo, 16 de março de 2014

" INTIMIDADE"


Afogo-me nos beijos teus afoitos,
num juntar-me ao louco frenesi
que teu corpo estremecido 
transborda 
me pedindo bis. 
E eu,
também estremecendo,
entrego-me,
num amoldamento
só 
para teu sentir.
Nesse jogo
de sensações e derrames,
somos uma estampa
de peças coladas
sem distinção.

-Luiza Valio-

quarta-feira, 12 de março de 2014

"CAMINHO CERTO"


Um caminho assim 
tão bem feitinho
só pode terminar 
num jardim florido
onde hajam esperanças
de paz e de glórias
serenas tanto quanto as necessárias
para o mundo harmonizar-se
de novo e totalmente.
Nessa beleza leve
que à alma fortalece,
recolha-se a graça
de um sublime encontro
com o amor de Deus.

"INABSORVENTE"


Não que não o queira:
meu coração é que se retrai
quando ele se aproxima 
e, num gesto suave, 
quer tocar-me as mãos.
Um frêmito,
um tremor,
um surdo sentimento.
Que sentir é esse?
É como raiva,
medo ou ira?
Eu, tão forte, 
tão dono de mim, 
deixar-me cair assim 
nesse estranho torvelinho 
carregado de tão cálidas sensações...
Não que não o queira,
mas não posso dar-me,
nem deixar-me dominar assim
por esse amor que chegou agora
tão fora de hora
e tão fora de mim...

sábado, 11 de janeiro de 2014

"FUMAÇA"



Era esguia
a mulher que seguia
cabisbaixa e fria
pela estrada que conduzia
à imensa pradaria.
Braços jogados, 
como que soltos do resto do corpo.
Olhos semicerrados, 
assim como fazem os doentes
sob o peso de um mal incurável.
...
De repente, um baque,
um corpo rolando
na ribanceira infinita
daquele mundão esquecido.
...
Ninguém viu.
...
Nem tinha nome
aquela alma penada
que desistia da vida de vez.
Quem seria 
a mulher desaparecida
debaixo do verde tapete
daquela pradaria?